Inspiro ares parados, atmosfera confortada, quarto
fechado de mim mesma. Minhas paredes estão cheias de bolores – nem a umidade
faz bem a esse ambiente em que me tranquei. No entanto, esses ares não são
pesados. De um tempo para cá – desde que eu comecei a nota-los – eles têm se
tornado cada vez mais leves. Talvez que perceber que algo está errado seja o
primeiro passo. E está. Há algo por aqui de muito errado. Não é certo sentir o
ar tão pesado nas costas e tão tóxico aos pulmões. Não é certo permitir dentro
de mim tantos bolores e poeira. Mas, agora, é como se tudo isso flutuasse numa
dança desconexa.
Caos. Caos e o sentimento de emergência da mudança.
Ah, como é necessário que se mude! Bagunçar a bagunça da qual se é feito, com a
qual já se está tão acostumado que até parece o estado normal das coisas, para
então ajustá-la. Sim, sinto latente a mudança. Ela está sorrindo para mim quase
que assustadoramente, mas eu não tenho mais medo: encaro-a nos olhos insanos e
sorrio de volta, lançando o desafio. Ela urra e chacoalha as mãos cheias de
unhas compridas, mas depois abaixa a cabeça à minha vontade.
A mudança está aí, esperando que se mude. De olhos
baixos, agora que já não a temo. Suave, agora que a vejo como necessária.
Também a bagunça foi necessária ao seu tempo – como
poderia eu entender que a ordem era ordeira se não houvesse aquela dorzinha no
peito quando eu inspirava aqueles ares? Foi bom, muito bom, ver as heras
venenosas subirem altas dentro do meu espaço, pois agora as eras suaves serão
bem-vindas e abençoadas da maneira que se deve.
Basta apenas arrancar pela raiz os maus costumes, os
pensamentos que me colocam para baixo, as atitudes que não me servem mais. Para
a mudança, agora que dela não tenho mais medo, basta apenas que se mude. Ela
sorri, agora, complacente.
Com amor, ponho em execução meu plano de reforma. Com
amor, esfrego as paredes e tiro o lodo de mim. Com amor, arranco as heras. Com
amor, abro a janela – para ver o dia lindo lá fora, para ver a vida linda aqui
dentro, para inspirar um ar inspirador. Com amor, deixo a porta aberta para o
amor. Com amor, sorrio à mudança. Com amor, amo a mim.